Aulas 8 e 9: Espelho, espelho meu... afinal, quem sou eu?
Os alunos ao final dessas aulas deverão estar aptos a:
reconhecer que os diferentes grupos humanos possuem uma produção cultural: religiões. Mitos, artes e técnicas;
conhecer as influencias culturais de diferentes povos na construção da identidade brasileira;
perceber-se como um ser único e ao mesmo tempo parte integrante da identidade nacional; e
identificar a cultura como espelho capaz de torná-los visíveis a si mesmos.
- Cesta básica (material necessário)
A motivação poderá ser feita retomando a obra musical de Antônio Nóbrega, cantor, ator, dançarino, poeta, pesquisador, multi-instrumentalista e, sobretudo, um apaixonado pelas raízes culturais brasileiras. Seu repertório musical vai do maracatu às cantigas de roda, explorando uma infinidade de linguagens e recursos cênicos.
A seguir, a letra de duas canções de autoria de Antônio Nóbrega, em parceria com Wilson Freire – “Quinto Império” e “Olodumaré”. Essas canções, juntamente com “Chegança” (das aulas 6 e 7) compõem as Cantigas do Descobrimento do Brasil.
Quinto Império
Antônio Nóbrega e Wilson Freire
Iaiá me dá teu remo.
Teu remo pra eu remar.
Meu remo caiu, quebrou-se
Iaiá lá no alto-mar!
Meu sangue é trilha
dos Mouros, dos Lusitanos.
Dunas, pedras, oceanos
rasteiam meu caminhar.
E sendo eu
que a Netuno dei meu leme,
com a voz que nunca treme
fiquei a me perguntar:
“O que será
que além daquelas águas
agitadas, turvas, calmas,
eu irei lá encontrar?”
ai, meu velho,
novo mundo hei de achar!
Eu decifrei
astros e constelações,
conduzi embarcações,
destinei-me a navegar.
Atravessei
a Tormenta, a Esperança,
até onde o sonho alcança
minha Fé pude cravar.
Rasquei as lendas
do Oceano Tenebroso,
pra El Rey, o Glorioso,
não há mais travas no mar.
Olodumaré
Antônio Nóbrega e Wilson Freire
Vou-me embora dessa terra...
- Olodumaré...
Pra outra terra eu vou...
- Olodumaré...
Sei que aqui eu sou querido...
- Olodumaré...
Mas não sei se lá eu sou...
- Olodumaré...
O que eu tenho pra levar...
- Olodumaré...
É a saudade desse chão...
- Olodumaré...
Minha força meu batuque...
- Olodumaré...
Heranças da minha nação...
Ainda me lembro
do terror, da agonia,
como um louco eu corria
para poder escapar.
E num porão
de um navio, dia e noite,
fome e sede e o açoite
conheci, posso contar.
Que o destino
quase sempre foi a morte,
muitos só tiveram a sorte
da mortalha ser o mar.
Na nova terra
novos povos, novas línguas,
pelourinho, dor, à míngua
nunca mais pude voltar.
E mesmo escravo
nas caldeiras das usinas,
nas senzalas e nas minas
nova raça fiz brotar.
Hoje, essa terra
tem mau cheiro, minha cor,
o meu sangue, meu tambor,
minha saga pra lembrar.
OBSERVAÇÃO: Os alunos deverão ter acesso às letras das canções, através de cópias ou dos textos escritos em um cartaz ou no quadro.
Sugerir aos alunos a realização da seguinte atividade, cumprindo as etapas abaixo:
1 – O que em sua aparência física se assemelha a uma determinada etnia? (cabelo, cor da pele, formato dos olhos, altura).
O que em seus hábitos culturais é herdado de um determinado grupo social? (preferências alimentares, religião, formas de convivência, gostos artísticos).
Relacionar as características étnicas que se considera ter, física e culturalmente.
“Sou índio quando...”
“Sou branco quando...”
“Sou negro quando...”
2 – Observar a caixa de presente preparada, anteriormente, pelo professor.
3 - Abrir discretamente a caixa de presente, olhando o seu conteúdo, sem contar aos colegas o segredo que ela esconde.
4 - Passar a caixa para o colega ao lado e assim, sucessivamente, até que todos tenham visto.
5 – Comentar, oralmente, o que viu e suas observações, em relação às características étnicas familiares e ouvir as observações dos colegas.
6 – Observar seu retrato, relacionando com a imagem vista no espelho: seu cabelo, a pele, o olhar, a expressão fisionômica. Reparar o desenho do nariz, do queixo, das orelhas.
7 – Desenhar seu auto-retrato com grafite, lembrando que ele, além de mostrar um rosto, pode também refletir uma personalidade, um jeito de ser. É importante atentar para detalhes, particularidades que caracterizam a fisionomia.
8 – Explorar, com lápis preto ou lapiseira, recursos de luz e sombra, utilizando texturas, sugerindo volumes.
9 – Recortar o contorno do auto-retrato desenhado e organizar com toda a turma uma colagem inspirada na obra de Tarsila do Amaral, encontrada na Internet: “Operários”.
10 – Trabalhar o fundo da composição, que poderá ser intitulada “Construtores de si mesmos”, utilizando cores, que farão contraste com os retratos em preto e branco.
11 – Criar uma moldura diferente para o painel usando, por exemplo, formas irregulares. Nessa moldura poderão ser escritas palavras que simbolizem a mistura étnica representada no trabalho coletivo.
12 - Analisar com os colegas a produção final, percebendo relações entre o quadro “Operários”, de Tarsila do Amaral e o painel “Construtores de si mesmos”.
OBSERVAÇÃO: Seria interessante a montagem de um outro painel, utilizando também as fotos trazidas pelos alunos. Esse painel só deverá ser montado se todos os alunos concordarem em recortar as fotos. Essa construção possibilitaria uma ótima análise de mudanças e semelhanças entre os relatos e os auto-retratos.
Sistematizar e avaliar os conteúdos trabalhados nessas aulas, a partir da observação dos auto-retratos, lembrando aos alunos sobre:
1 – a importância de conhecermos e valorizarmos nossas origens culturais;
2 – as características étnicas dos nossos antepassados herdadas por cada um de nós;
3 – os hábitos adquiridos pela convivência com diferentes culturas;
4 – a percepção de características individuais e a sua tradução através do auto-retrato;
5 – a observação, em obras de artistas, de traços representativos de diferentes etnias; e
6 – a exploração de diversas expressões fisionômicas, transparecendo estados da alma, presentes nas obras dos alunos e dos artistas.
Textos para refletir e discutir em grupo.
1 – Procura-se
Mércia M. Leitão
Eu brasileiro, procuro minha identidade. De onde vim, para onde vou?
Se gosto de tomar banho todo dia, beber um chazinho de ervas e deitar na rede, dizem que herdei a origem indígena.
Se acendo uma vela para Santo Antônio, adoro uma festa junina, dançar o Boi Bumbá, participar da procissão do Divino, falam que é por causa do meu sangue português.
Já, quando o ritmo do atabaque ecoa no jogo atlético da Capoeira, nos terreiros de Umbanda ou no rebolado do Samba e não consigo ficar parado, aí sou africano de corpo e alma.
Isso tudo sem falar do acarajé, vatapá, caruru ou quem sabe uma macarronada, pizza, e para variar um hambúrguer e até um sashimi, quando se fala de gostosuras que vieram de outros lugares para aqui ficar.
Na verdade, sou pouco de tudo e de todos os povos que deixaram sua marca na formação da identidade desse menino chamado Brasil.
2 - “Aprendi loas, toadas e cantigas de cirandeiros, aboiadores e cantadeiras; aprendi choros, músicas de banda cabaçal e ponteados de violeiros, pifeiros e “chorões”, passos, gingados e mugangas de sambadores, dançarinos e brincantes. Através deles aprendi a amar o meu País e seu povo.
O Brasil precisa ser ver melhor e se ver como nação, para neutralizar o abismo do poder econômico. A cultura é o grande poder mediador desta disparidade.”
(Antônio Nóbrega. Revista Guest, Ano II, nº 6, julho-agosto, 2003)
3 – Sou negro
Solano Trindade
“Sou negro.
Meus avós foram queimados
pelo sol da África.
Minha alma recebeu o batismo
dos atabaques, gonguês e tambores agogôs.
Na minha alma, ficou
o samba,
o batuque,
o bamboleio
e o desejo de libertação...”
O tema “Espelho, espelho meu... Afinal quem sou eu?” poderá ser desdobrado através de pesquisas e elaborações criativas. Aqui são destacadas algumas possibilidades:
1 – Reconhecer a força da herança negra em nossa formação cultural, fazendo a leitura e análise do texto
Presença Negra.
Quantos séculos serão necessários para avaliarmos a riqueza e a fecundidade das tradições culturais africanas? Elas retornam em ondas musicais e artísticas, sob formas sempre novas e diferentes, fiéis à sua inspiração primordial.
Civilizações importantes com suas histórias culturais se prolongaram no Brasil com a vinda dos negros para este país, e muitos artistas brasileiros desenvolveram sua obra na trilha de seus ancestrais africanos .
O lugar do negro no Brasil continua sendo um foco privilegiado para repensar o significado da nação que foi construída. Fortalecido o olhar estrangeiro e também pela sociedade local, o preconceito marca a identificação do negro segundo um imaginário cheio de estereótipos.
O transplante forçado de povos diversos do continente africano em regime de escravidão acarreta uma aculturação problemática em que representação de si mesmo conheceu vários percalços.
É longa a história destes descaminhos. Mesmo artistas negros ou mestiços do período colonial, como Aleijadinho e Mestre Valentim, não ousaram representar o homem negro em suas obras. Nem mesmo no século XIX os artistas da Academia tiveram tal liberdade.
Na atualidade, as raízes africanas e a contribuição negra na sociedade abrem caminho próprio de expressão nas artes brasileiras.
As contribuições da cultura negra foram e são fundamentais em nossa sociedade. As manifestações de origem afro-brasileira, quer façam parte de formas tradicionais de sociabilidade, como as chamadas festas folclóricas, quer se integrem ao cotidiano das grandes metrópoles, como a contracultura negra do hip-hop, estão presentes no cotidiano do nosso povo.
Adaptação de Brasil + 500, Mostra do Redescobrimento
2 – Conhecer a visão de artistas estrangeiros que passaram por nosso país e o importante registro histórico de época que fizeram e nos deixaram como herança, lendo e debatendo o texto
Olhares de viajantes.
Em uma época em que não existia a máquina fotográfica, os pintores, para reis e nobres, eram os fotógrafos que podiam perpetuar os seus feitos e fazer retratos dos membros da corte. Assim, os reis se faziam acompanhar de pintores e desenhistas que eram responsáveis pelo registro das imagens da época.
Em 1808, D. João VI transferiu a corte portuguesa para o Brasil. Em 1816, ele providencia a vinda da Missão Artística Francesa. Entre os artistas que aqui chegaram, certamente, o mais conhecido dos brasileiros é Jean Baptiste Debret (1768-1848), pois seus trabalhos, que documentaram a vida no Brasil, durante o século XIX, são muito reproduzidos nos livros escolares. A obra de Debret possui grande valor documental. Através dela tem-se uma ideia nítida da paisagem e da vida do Rio de Janeiro, dos tempos de D. João VI e do início do Império Brasileira.
Embora não assumisse nenhuma posição anti-escravista, Debret registrou com fidelidade o martírio da escravidão e grande parte de suas aquarelas são dedicadas às atividades dos escravos.
A obra de Debret é um retrato autêntico do espírito e dos costumes brasileiros do início do século XIX e assim, uma fonte indispensável para o conhecimento da História do Brasil.
Mércia M. Leitão, 2003.
3 – Explorar imagens e textos na Internet relativos a essas aulas, sobre obras artísticas e sobre artistas que desenvolveram trabalhos ligados à cultura negra, tais como Emanuel Araújo, Rubem Valentim, Mestre Didi e Heitor dos Prazeres.
4 – Levantar o conhecimento do grupo, listando influencias e hábitos de outras culturas assimilados no nosso cotidiano.
5 – Despertar o olhar para a representação que os artistas fazem de si mesmos, através da leitura do texto Espelho de Artista e da observação de auto-retratos de diferentes épocas.
Espelho de Artista
Na verdade, o auto-retrato sempre acompanhou o ser humano em seu desejo de deixar uma marca de sua própria imagem, mesmo depois da passagem de sua vida. Essa autorrepresentação foi tomando diferentes formas no decorrer do tempo e do espaço.
O retrato tornou-se realmente popular na época do Renascimento (séculos XV ao XVII) pois, nesse momento da história ocidental, o ser humano passou a ser o centro das atenções.
Como a fotografia ainda não existia, pintores eram contratados para registrar os rostos e corpos de pessoas importantes. Muitos artistas também pintaram auto-retratos, registrando sua imagem como pessoas humanas e como profissionais, pois nestas obras ficava evidenciada a capacidade artística de cada um deles.
O auto-retrato é o espelho do artista. Mas, ele não precisa ser um retrato que pareça ter sido fotografado. O autor tem liberdade de simbolizar vontades, paixões, emoções, sonhos e até de brincar com sua própria imagem como nas caricaturas. Um auto-retrato pode salientar formas de rosto e do corpo do artista. Formas que ele aprecia ou que ele rejeita em si mesmo.
Na verdade, qualquer que seja o modo de expressão, a época ou o lugar em que a arte se manifeste, ela tem tentado traduzir o mundo que se oculta atrás de cada rosto humano, o seu mistério e, por vezes, a sua angústia.
Texto adaptado do livro Espelho de Artista, de Kátia Canton, Editora Cosac Naify, São Paulo, 2001.
6 – Pesquisar, em jornais, revistas, Internet, caricaturas de pessoas famosas. Procure utilizar a mesma técnica para representar a si mesmo e também os colegas de turma.
Livros:
BARBOSA, Rogério de Andrade. Bichos da África. São Paulo, Editora Melhoramentos, 1988.
CANTON, Kátia. Espelho de artista. São Paulo, Cosac e Naify Edições, 2001.
CASTANHA, Marilda. Agbalá um lugar-continente. Belo Horizonte, Editora Formato, 2001.
LEITÃO, Mércia M. E DUARTE, Neide. Um fotógrafo diferente chamado Debret. São Paulo, Editora do Brasil, 1996.
Filmes:
- Por um fio de memória
- Quilombo
Endereços eletrônicos:
Professor: Lembre-se também de fazer: Achados e perdidos (considerações do professor)
Chegamos ao final de mais uma sugestão de trabalhos para serem executados em turmas do PROETI.
Professor, isto é apenas uma sugestão. Utilize a sua capacidade criadora e sua intenção de aprender e ensinar.
Bom trabalho.
Postado por Susana Lúcia do Nascimento